O Caminho do Retorno: envelhecer à maneira taoista

O Caminho do Retorno, artigo que publiquei em 2010, novamente na revista Horizontes Antropológicos, aborda o ciclo da vida na percepção da tradição taoista. Ainda que envelhecer seja uma inevitável parte da existência corporal, é possível fazê-lo mais lentamente, com qualidade de vida e saúde. Desse modo, envelhecer à maneira taoista é tornar-se fonte de benefício coletivo. Nossa experiência, a sabedoria que desenvolvemos ao longo dos anos, fica disponível para ser compartilhada, pois a vitalidade continua plena. Segundo a tradição, para quem seguir a natureza, é possível retornar à primavera. A velhice não precisa ser declínio inexorável, pode ser oportunidade de novo começo. Como já havia citado na epígrafe do artigo: “O retorno é o movimento do Caminho [Tao 道]“ (Daodejing 道德經, poema 40) Mas isso implica uma certa forma de viver, em sintonia com os ciclos naturais dos horários do dia e da noite, das fases da lua e estações. Na contramão da aceleração vertiginosa da vida contemporânea, aprender a mover-se mais devagar, como uma tartaruga, símbolo taoista por excelência da longevidade. Doze hexagramas do Yijing (易經), o Livro das Mutações, são utilizados para descrever o ciclo do dia, do ano e, por extensão, da vida humana:

12 hexagramas HA

(diagrama originalmente publicado em Bizerril, 2010, link acima)

O diagrama é lido de dentro para fora. No princípio do ciclo, há apenas yin (as linhas pretas interrompidas), situação representada pelo hexagrama Kun, o Receptivo, a Terra. O surgimento do Yang é representado pelo hexagrama Fu, o Retorno, com o aparecimento da primeira manifestação do yang (a linha branca contínua), que cresce gradualmente até ocupar todas as linhas do hexagrama Qian, o Criativo, o Céu. Tendo o yang chegado ao apogeu, a alternância é inevitável: na sequência surge uma linha yin no hexagrama seguinte, Gou. Daqui em diante, as linhas yin avançam  gradual e inexoravelmente até ocuparem novamente todo o hexagrama. Chegando a este ponto, há uma encruzilhada: a morte ou o retorno à vida. A estratégia taoista é desacelerar o processo natural de dispersão do e,  combinando os treinamentos a um modo de vida harmônico com as condições naturais, manter seu equilíbrio e plenitude. Mas a longevidade é apenas um aspecto do caminho. Além de treinar a vida, é preciso também treinar o espírito, por meio da serenidade. É com um coração sereno que as qualidades latentes de amor e sabedoria podem se manifestar espontanemente.  Esse é  um dos propósitos das práticas contemplativas.