A única constante na vida é a mudança

Continuando com o propósito de relacionar vida cotidiana e filosofia taoista, o tema da postagem de hoje é uma parte fundamental dela. Enquanto a maioria das tendências do pensamento filosófico ocidental, da antiguidade até pelo menos o início do século XX, trabalhou com a ideia metafísica de essência, que o mais importante é algo imutável, o fundamento do pensamento taoista é o movimento, a mudança. Isto está expresso em conceitos como Tao (Dào), yin-yang (yīn-yáng 陰陽), Taichi (Tàijí 太極), mutação ( 易), etc. Resumindo tudo isso num princípio simples: o caminho natural tende ao equilíbrio dinâmico; quando algo chega ao extremo se transforma no seu contrário.

Nebulosa planetária MyCn18, imagem do telescópio Hubble, NASA & ESA. O formato dessa nebulosa lembra muito a forma antiga do pictograma chinês “mistério” (xuán 玄).

Todos esses conceitos estão em consonância com uma característica fundamental de toda a vida, que podemos perceber ao observar a natureza, a sociedade ou nossa própria existência pessoal: tudo que está vivo está em perpétuo movimento. Na verdade, todo o universo, mesmo o que consideramos como matéria inanimada também está em movimento: nossos corpos e consciências, as sociedades e culturas, as plantas e animais, a paisagem geográfica, os corpos celestes e mesmo a menor das partículas. Em resumo, tudo é movimento, ritmo, mudança, transformação. Nesse ponto, o conhecimento tradicional chinês está em total concordância com o conhecimento científico moderno, seja da biologia, da física, da geografia, da astronomia, ou da história e das ciências sociais.

Pintura em seda, acervo do National Palace Museum, Taipei. foto do autor, setembro 2018.

Se isso é óbvio no nível material, também faz sentido ao observarmos com cuidado nossa experiência existencial: estar vivo é vivenciar constantemente novas percepções, impressões, emoções, pensamentos, incessantemente. Estamos vivos enquanto nossa capacidade de autorregulação continua a fazer as mudanças adaptativas necessárias, sejam metabólicas, fisiológicas, motoras, mas também emocionais e cognitivas, relacionais, um ajuste existencial contínuo, em todos os níveis, diante das situações que mudam a cada momento. Estar vivo é mover-se, mas também sensibilizar-se, aprender, descobrir.

mestre Liu Pailin (1907-2000).

O que a prática do Tao nos ensina é a nos manter em movimento de modo inteligente, em harmonia com o que cada momento pede, sem fazer força desnecessária, sem agitar o coração. Assim, saboreamos mais cada experiência, envelhecemos com sabedoria e saúde, passamos por situações difíceis com alguma serenidade, não nos desgastamos à toa. Não é casual que uma expressão de realização do Tao seja o riso, leve e espontâneo como o de uma criança pequena. Algo que só podemos vivenciar num estado de relaxamento. E essa leveza nos sensibiliza, quando estamos na presença de um mestre realizado. Foi assim que muitas pessoas começaram a praticar, após se encontrarem frente a frente com o mestre Liu Pai Lin, como ouvi repetidas vezes no final do anos 90, quando fazia meu trabalho de campo antropológico em sua escola. Também foi essa leveza que me fez buscar o caminho. Obrigado, mestre!

Aprender o Tao: 3. o lugar do gesto

Nessa nova postagem da série, o foco está no aprendizado prático. Para saber fazer, dependemos de uma capacidade humana fundamental de perceber e reproduzir semelhanças, que Walter Benjamin chamou de “faculdade mimética”. Consideremos que, nesse contexto, ela se manifesta como a capacidade de observar, reconhecer e reproduzir movimentos corporais, com suas sutis qualidades implícitas e sensações características, ideia que já havia desenvolvido no capítulo 6 de minha tese de doutorado, dedicado ao aprendizado do Tàijíquán.

Imortal voando num dragão, detalhe de pintura do acervo do National Palace Museum, Taipei. Foto do autor, setembro de 2019.

Mas como isso participa do aprendizado do Tao? Duas respostas provisórias: I) pelo fato de aprendermos a sentir com o corpo e no corpo a naturalidade e a fluidez eficaz; II) e de adquirirmos habilidades motoras e perceptivas que são o fundamento de vários saberes taoistas. Quanto ao primeiro aspecto, destaco que certos conceitos filosóficos caros ao taoismo, como os de wújí (無極), de tàijí (太極) ou de wúwéi (無為), por exemplo, são de difícil compreensão quando ficam restritos ao nível do intelecto, mas algo simples no plano da experiência corporal. No começo, ao observar como faz o/a mestre/a, ou ao menos algum/a praticante mais experiente, fica evidente uma certa graciosidade eficaz, sem esforço e aparentemente sem intencionalidade. Depois, com o tempo de treinamento, isso se evidencia na experiência pessoal, ao se ganhar gradualmente maestria sobre uma determinada técnica, até que ela faça parte da potência do corpo, não sendo mais algo distinto dele. Uma vez compreendido o gesto exemplar da técnica, com suas nuances sutis, o caminho é repetir e repetir, treinando até se apropriar dele. Em um primeiro momento, para certos/as estudantes, o intelecto pode ajudar a sistematizar uma compreensão rudimentar inicial, mas o verdadeiro aprendizado é sem palavras. É ele que sedimenta o conhecimento, que passa a fazer parte do repertório potencial de habilidades corporais.


É assim que 1 hábil artista marcial executa uma técnica em uma fração de segundo, reagindo à situação sem pensar. Também desse modo, 1 acupunturista experiente lê toda a condição de 1 paciente ao tocar seus pulsos e auscultá-los e insere as agulhas em pontos precisos de modo indolor. Dessa maneira, também a meditação começa, simplesmente ao se assumir a postura corporal e a atitude existencial correta: o se manifesta e começa a circular espontaneamente. Cada uma das habilidades que venho desenvolvendo gradualmente ao longo dos anos se deve à convivência com exemplos vivos: o mestre, um/a professor/a, um/a irmã/o de treinamento mais generosa/o que abriu as portas da compreensão ao proporcionar uma experiência marcante. Uma vez entendida a direção a seguir, só então, livros, imagens, vídeos e outros recursos didáticos e mnemônicos podem cumprir seu papel como ferramentas auxiliares ao aprendizado direto (corpo a corpo), graças à experiência pessoal previamente adquirida. O Caminho não se esgota: quanto mais se aprofunda, mais há a aprender e a compartilhar. Mas a partir de certo ponto é um aprendizado diferente: em vez de aumentar o volume de conhecimento, aprofunda-se a sua compreensão a tal ponto que o conhecimento se simplifica e se integra. Começamos a perceber os mesmos princípios que se expressam em diferentes áreas e múltiplas aplicações. Que perfeição! O próprio treinamento, se praticado corretamente, torna-se também um professor.

Aprender o Tao: 2. o lugar da imagem

Nessa segunda postagem da série, abordaremos o papel da iconografia na transmissão do Tao. Como ponto de partida, digamos que, no princípio está a experiência cinestésica, um corpo que sente e se move, no domínio pré-objetivo, sem a necessidade de palavras. Em segundo lugar, vem a imagem: símbolo, emblema, diagrama, pintura, síntese visual não só de uma experiência, mas de todo um entendimento não verbal acerca do mundo. Aqui cabem os dizeres geniais da obra clássica de Marcel Granet: o pensamento chinês é de natureza sintética. Ou dito de outro modo: poucos princípios, infinitas aplicações.

Imortal voando num dragão, detalhe de pintura do acervo do National Palace Museum, Taipei. Foto do autor, setembro de 2019.
O símbolo do Taiji rodeado do Bagua do Céu Anterior, com os trigramas Zhen e Xun atravessados pela espada, conforme utilizado pela linhagem taoista Pailin.

Tomemos como exemplo o símbolo mais central da tradição taoista, aquele que engloba seu traço mais distintivo. Uma verdadeira pérola da civilização chinesa. O símbolo do Tàijí (太極) ☯: yīn (陰) e yáng(陽) unidos em um movimento incessante de alternância, oposição, complementaridade e inseparabilidade. Uma só imagem que não apenas descreve de forma genial a natureza processual de todos os fenômenos, micro e macro, pessoais e coletivos, sociais e naturais, mas também prescreve uma postura existencial, informando uma verdadeira arte da existência. Os oito trigramas (八卦), oito manifestações básicas das possíveis combinações de yīn e yáng, nos três níveis da realidade: Céu (天), ser humano (人) e Terra (地) que compõem os 64 hexagramas do Clássico das Mutações (Yìjīng易經). Também eles são compostos de apenas duas possibilidades, yīn e yáng, dessa vez representados, respectivamente, por uma linha partida () ou uma linha contínua (). Resumindo, em uma representação iconográfica relativamente simples está contida toda uma filosofia da natureza, acessível à apreensão intuitiva.

Além de outras imagens clássicas da chamada filosofia yīn/yáng, como o Diagrama do Rio e o Livro Lo, poderíamos incluir como exemplos também as imagens alquímicas e mesmo as pinturas taoistas, nas quais o vazio tem pelo menos a mesma importância que as formas. Em certo sentido, a própria escrita chinesa, especialmente as formas mais estilizadas de caligrafia como estilo de pintura, tem essa característica imagética evocativa, habilmente utilizada também na poesia. O pictograma é uma palavra-imagem, com um poder evocativo distinto dos alfabetos das línguas ocidentais, ao menos para um/a leitor/a da língua chinesa suficientemente embebido/a em sua atmosfera cultural.

Detalhe de caligrafia sobre papel, acervo do National Palace Museum, Taipei, foto do autor em setembro de 2018.

No entanto, mais uma vez, para aprender o Tao não basta a imagem, pois em geral ela não se revela por si própria. É preciso um/a mestre/a que nos ensine a ver. Mais uma vez, é a presença corporal encarnada, em uma relação pessoal, que nos dá a ver o Tao por meio das imagens, assim como permitiu lê-lo ou ouvi-lo entre as palavras.

Aprender o Tao: 1. o lugar do texto e da transmissão oral

A nova série que começa hoje abordará aspectos do aprendizado do Tao. Na postagem de hoje, o tema é o papel das palavras. Embora seja óbvio que o Caminho está além das palavras, por isso mesmo, inominável e indescritível, como afirmado desde Laozi ou Zhuangzi, ainda assim, elas têm o seu lugar na transmissão. Diz-se que o cânon taoista contém 108 textos clássicos. No entanto, segundo a transmissão oral que recebi de meus professores, também é dito que as instruções realmente importantes nunca são colocadas na íntegra nos livros.

Imortal voando num dragão, detalhe de pintura do acervo do National Palace Museum, Taipei. Foto do autor, setembro de 2018.

Há motivos distintos para isso. Alguns aspectos do ensinamento estão além das palavras e só podem ser compreendidos intuitivamente, por experiência direta, mediante a prática consistente dos treinamentos que levam ao cultivo de um estado meditativo. Por isso, Laozi utilizou termos como mistério (xuán) ou maravilha (miào妙). Uma maneira de explicar isso para o/a leitor/a com um inclinação mais filosófica é recorrer à fenomenologia de Merleau-Ponty. Digamos que aquilo que é tematizado por referência à noção de Tao (道) seria da ordem do pré-objetivo. Ou seja, mais do domínio da percepção e da sensibilidade do que da ordem do intelecto e do discurso. Por outro lado, isso não inviabiliza que a tradição taoista tenha encontrado maneiras de comunicar essa compreensão fundada na experiência direta. Por isso, Zhuangzi afirma que o valor dos livros está em algo que se balança além das palavras. E no poema 1 do Xishengjing é dito: “Quando não se conhece o Tao, palavras criam confusão” [minha tradução] (Kohn, 1991, p.235 apud Bizerril, 2007, p. 19).


pintura do acervo do National Palace Museum, foto do autor, setembro de 2018.

Além disso, outro aspecto é que há conhecimentos técnicos específicos que poderiam causar danos se caíssem nas mãos erradas, de pessoas imaturas ou inescrupulosas. Assim, quem ensina é responsável por testar a maturidade e integridade da/o discípula/o antes de transmitir semelhantes conhecimentos. Só para ilustrar, os textos de alquimia interna foram escritos não só em linguagem poética, mas também repletos de imagens que sintetizam os segredos técnicos da prática, mas de uma forma cifrada, acessível apenas a quem tem a chave de leitura. Essa, por sua vez, depende de um/a professor/a qualificado/a e do desenvolvimento da sensibilidade e inteligência da/o praticante.

Assim, ao mesmo tempo que a tradição taoista confiou aos livros, e mais recentemente aos meios multimídia contemporâneos, sua experiência acumulada, ainda é necessário como ingrediente para o aprendizado, a transmissão oral que se faz de mestre/a a discípulo/a, de professor/a a aluno/a. E, como já foi mencionado em postagens anteriores, alguém só pode ser considerado mestre quando cumpre os critérios tradicionais que indicam que completou seu treinamento até atingir um nível de realização estável, cujos sinais foram reconhecidos coletivamente. Para ser instrutor/a, não é necessário ser mestre/a, mas é preciso ter praticado suficientemente o que se pretende ensinar, até obter seus benefícios, e ter a permissão de seu/sua próprio/a professor/a. Isso tudo porque um dos ingredientes fundamentais da transmissão é a palavra viva de alguém que vivenciou o que ensina e compreendeu essa vivência corretamente. Não basta eloquência e mero conhecimento intelectual.

Por outro lado, uma mestre/a pode deixar, como parte de seu legado, escritos para guiar seus/suas estudantes na direção certa. Mas não é demais repetir, mais uma vez, que as palavras apenas apontam o caminho a seguir.

Benefícios da prática em detalhes: 6. uma síntese

Ao longo dessa série, meu esforço foi responder, de modo acessível ao público leigo, a seguinte pergunta: mas afinal, por que praticar exóticos exercícios chineses como taijiquan ou qigong? Qual a relevância dessas práticas nos dias de hoje?

As várias postagens anteriores tentaram evidenciar, com contribuições de pesquisas da medicina ocidental os inúmeros benefícios comprovados, mensuráveis desses exercícios, que justificam recomendar sua prática como prevenção e promoção de saúde, como maneira de envelhecer sem decrepitude e com qualidade de vida, mas também como recurso terapêutico complementar para várias doenças crônicas. Foi isso que pretendi compartilhar, em linguagem acessível e utilizando uma fonte confiável de divulgação do conhecimento médico convencional sobre o tema.

Tendo compreendido os benefícios da prática, fica fácil entender porque o treinamento regular, de preferência diário, é um dos segredos da notável vitalidade, saúde e vivacidade de espírito de tantos e tantas praticantes experientes na China e pelo mundo afora, inclusive no Brasil, onde o famoso mestre Liu Pailin, fundador de uma das escolas que pratico e ensino, teve um papel pioneiro na divulgação da medicina tradicional chinesa e do métodos taoistas de longa vida, como o taijiquan e tantos outros.

mestre Liu Pailin (1907-2000)

Voltando à explicação baseada no pensamento chinês, as teorias de fundo que orientaram o desenvolvimento de técnicas corporais taoistas e outros métodos chineses de saúde e longevidade, como o taijiquan, provêm da filosofia taoista e da medicina tradicional. Em vez de separar/opor corpo e mente, como na perspectiva cartesiana que formou a medicina convencional ocidental, a relação corpo e mente é concebida aqui como um contínuo. A consequência é que o equilíbrio do dos órgãos e vísceras contribui para o equilíbrio emocional e vivacidade da consciência, e vice-versa. A plenitude do , a harmonia de yin e yang, a capacidade de manter o coração sereno diante das circunstâncias: tudo isso é a base da saúde e da longevidade, mas também o fundamento para percorrer o caminho do Tao. O equilíbrio no corpo é a base que permite o cultivo da espiritualidade. Por isso, ainda que toda a prática beneficie ao mesmo tempo a saúde e a serenidade, práticas mais aprofundadas de meditação normalmente são ensinadas depois dx praticante aprender a regular o e o coração, aqui entendido no sentido de consciência. Ou nos termos tradicionais, o “cultivo da vida” começa antes do “cultivo do espírito” e é a sua base.

As agitações e preocupações da vida diária, a relação desproporcional entre movimento e quietude, tudo isso cobra o seu preço sobre nossa saúde e sanidade. E, vivendo numa grande cidade, fica cada vez mais difícil escapar do excesso de trabalho, mas também do desgaste excessivo nos momentos de lazer. Mestre Pailin recomendava: “pessoas de meia idade (após os 35 anos), andem devagar”. Havia uma ironia não dita nessa recomendação: devagar, “a caminho do cemitério”. Quem quer ter uma vida longa e possuir não só saúde, mas também boa disposição e manter suas capacidades cognitivas e corporais também na velhice precisa aprender a se preservar. Descansar, manter o coração sereno, interagir com o da natureza, usar apenas a força necessária para realizar uma tarefa. Essas são as recomendações básicas contidas nos inúmeros ensinamentos do mestre. E treinar, treinar e treinar. O mestre afirmava que não ousava ficar um dia sem praticar. Explicava que sua longevidade e impressionante boa saúde em idade avançada se deviam aos treinamentos, pois era de uma família em que as pessoas morriam muito jovens.

O Corpo Taoista: 4. a educação corporal

Nesta quarta postagem da série O Corpo Taoista, o assunto é a educação corporal como arte da existência. Levar em consideração apenas as concepções de corpo sem atentar para as práticas corporais taoistas seria um grave mal entendido, pois os conceitos são descrições que permitem expressar e cultivar experiências. Traduzindo em termos práticos, cultivar o Tao equivale a uma (re)educação dos sentidos, da postura e dos modos de se mover. Mais uma vez, como a expressão dos mesmos princípios básicos, o corpo taoista senciente e em movimento, percebe sem se agitar e move-se em conformidade com o que é observado na natureza como a  chave para a continuidade: movimento lento, contínuo, gradual e circular, como foi reconhecido pelos antigos sábios taoistas ao contemplarem os astros, os ciclos das estações e outros fenômenos naturais. Ou como afirma a transmissão oral, inspirada no  Yijing: “o Céu e a Terra são duradouros porque sabem se mover continuamente”. Não só o movimento corporal se inspira nos ritmos naturais, mas também se harmoniza à manifestação cíclica de yin e yang no universo.  Há também inúmeros exercícios baseados nos movimentos de animais, reais ou míticos, uma apropriação seletiva de suas qualidades. O Caminho é percorrido por meio de um duplo aprendizado: contemplando diariamente a natureza e praticando os métodos transmitidos ao longo das gerações, tendo como exemplo uma pessoa viva que encarna a tradição com seu próprio corpo, como foi o caso do mestre Liu Pai Lin ao longo de cerca de duas décadas no Brasil.

mestres taoistas

Na foto, da direita para esquerda, mestre Liu Pailin e alguns de seus mestres: Liu Beizhong (linhagem Kunlun), o ancião Nanshi Laoren, Liao Kong (linhagem Longmen), Tanlaisheng (linhagem Jinshan).

 

 

Mestres do Tao: tradição, experiência e etnografia

Mestres do Tao é o título de um artigo que publiquei na Revista Horizontes Antropológicos em 2005, uma versão reduzida de um dos capítulos de minha tese de doutorado sobre a escola taoista do mestre Liu Pai Lin (1907-2000). Nele, reflito sobre o papel na narrativa no aprendizado do Tao, como a palavra se combina a outros modos de transmissão da tradição e os dilemas da tentativa de fazer uma descrição etnográfica dela. Naquele momento, a figura do mestre Pai Lin (foto abaixo) me impressionava por sua saúde e vivacidade de espírito, com mais de 90 anos. E por, literalmente, encarnar o que ensinava, um conhecimento vivencial sobre a vida, não uma “filosofia” no sentido de um saber meramente intelectual, desencarnado. Não tinha ainda a dimensão do impacto desse contato breve na minha biografia. Vinte anos depois deste primeiro encontro, percebo que o que me impressionou foi a possibilidade de existir com fluidez e relaxamento, com lucidez e alegria de viver, inclusive em uma idade tão avançada. Um encontro que deixou uma marca profunda e plantou as sementes do momento atual. IMG_1308.jpg